domingo, 26 de abril de 2009

Sunday comes and sunday goes...

Não importa o quão ensolarado sejam os domingos. Eles sempre terão esse ar melancólico e nostálgico.Talvez pelas ruas vazias, talvez pelo almoço em família.Talvez pela história que costuma se repetir, sempre aos domingos.
Um dia tão cheio de coisa nenhuma...
Dia de leite com bolachas, pijama e cabelo solto. O domingo tem o som dos chinelos da minha mãe batendo no piso depois de ela ter descido da cadeira em que subiu para poder alcançar o pote de arroz.

...

Ás vezes me assusta a maneira como me tornei indiferente. Ainda tremo, mas já mantenho certa distância, talvez tudo isso tenha se tornado um espetáculo. Ouço com atenção pra interferir apenas quando me for solicitado.

Apesar da recomendação do ditado, eu meto a minha colher. É necessário. Não seria exagero dizer que muitas vezes foi questão de sobrevivência, mas acontece que a colher, apesar de ter-se tornado mais resistente já se cansou de sua função...
Os gritos de hoje não passam de ecos dos gritos de ontem. Já os sei, de cor.

Falam tanto de culpa, que já não sei mais quem é o culpado, ou se existe um culpado. Ás vezes sinto pena, apesar de ter consciência de que a pena é um dos piores sentimentos que existem...Mas quando vi aquelas fotos antigas senti pena, tristeza...Aqueles rostos que sorriam não imaginavam o quanto mudariam, o quanto sofreriam e quantas lágrimas provocariam. E não só nos próprios olhos.

Talvez a minha indiferença, que às vezes beira a insensibilidade, seja só uma válvula de escape. Foi aprendida.

Penso que as feridas que mais resistem à cicatrização são aquelas causadas pelas palavras.

terça-feira, 21 de abril de 2009

Diário de bordo

Parte I

Dá medo ficar lembrando demais. Medo que a memória altere alguma coisa e no fim já não se saiba o que foi real, e o que se tornou real apenas pela imaginação.Memória inventada.

Mas cheguei a ver quatro borboletas azuis, e disso tenho certeza. Nunca tinha visto borboletas como aquelas: eram grandes (porque se as vi de longe, tinham que ser grandes), e o azul era intenso, talvez o azul com mais intensidade de toda natureza. Foi a segunda coisa incomum do mês: primeiro foi a estrela cadente. Quando a vi imitei os personagens da ficção e fiz um pedido.Um pedido estúpido.


Parte II

Procurávamos pela casa naquelas ruas sem nome e ela nos surpreendeu de moto. A fachada havia mudado, nunca encontraríamos...

Gosto de estar em lugares diferentes, de andar sem saber o que há na próxima rua.


Parte III


Chovia e o mar estava agitado. Ao olhar para ele nem parecia que não nos víamos há tanto tempo, como quando a gente vê um amigo que já não via há algum tempo. Apesar de todas as diferenças em relação ao passado, existe a sensação de que nada mudou. Não sei por quanto tempo fiquei ali, olhando, navegando em terra firme, mas não foi por muito tempo.

Imagino que deva ser como olhar para o planeta Terra estando fora dele,sentir-se menor, mas de uma maneira positiva. O que é tudo diante de tanta água?


Parte IV


Se eu fizesse uma lista das coisas que eu mais gosto, “estar na estrada”, certamente faria parte dela. Prefiro os trajetos aos destinos. E pensei isso, no próprio trajeto. E pensei na vida como um trajeto...Eu deveria gostar mais da vida. E me lembrei das pessoas que não se importam em saber o final dos filmes antes de vê-los. Para elas o que importa é o processo.

A estrada à noite é um espetáculo, melhor que os fogos de artifício no início do ano. Luzes. Só luzes.

Só ontem reparei que para os que vão as luzes são vermelhas, e para os que vêm , são amarelas.

Luzes.

Aquelas pessoas que estavam comigo...Sem elas eu não existiria. E pensei em como seria existir sem elas...Por que apesar de todos os imprevistos, a ordem natural é que os mais velhos morram primeiro.

Todas aquelas luzes...Montanhas de luzes...



- Olá angústia!



Tive vontade chorar, mas não queria dar explicações, então guardei o mar nos olhos e torci para que a lei da gravidade contribuísse.Ainda bem que era noite.

quarta-feira, 8 de abril de 2009

Terça- Feira

Pelo vidro da porta não passa uma alma viva. Nem morta. Os únicos sons são o do papel riscando a folha e o do ar condicionado. Ao menos isso, ao menos não morro sufocada pelo calor que faria não fosse o trabalho incessante do ar condicionado. Ele trabalha mais do que eu.
Duas mesas, um computador (que só funcionaria se eu soubesse a senha) e seis cadeiras. Ás minhas costas livros e mais livros, de assuntos que poderiam me interessar se não fosse o tédio.
Na segunda gaveta vários clipes de papel em uma caixa aguardam o momento de serem úteis. O momento mágico em que um clipe unirá uma folha à outra. Junto a eles repousa um saco plástico cheio de elásticos, que por não terem sido úteis durante muito tempo derreteram-se e solidificaram-se em uma massa amorfa de borracha quebradiça.
Perto do teto, os jornais antigos e amarelados. Separei-os por mês, ano, e os coloquei em caixas. Pudesse eu organizar minha própria vida como organizei esses jornais...
O chão é de um azul –esverdeado. É o mar de um quadro impressionista. O teto me lembra sorvete de flocos : grandes placas brancas salpicadas de pingos pretos.
Joguei um alfinete no chão e comprovei a potência do silêncio.
O lugar e a situação são próprios à alucinações. Ainda não as tive. Ainda não conversei com seres imaginários sentados nas cadeiras vazias à minha frente... Talvez isso seja um exagero, o mais perto que cheguei disso foi ver um vulto no vidro da porta.

Entendo porque O Náufrago criou Wilson...

domingo, 5 de abril de 2009

Os Pássaros

Céu limpo, não há mais pássaros. Às vezes os vejo, mas não acho que sejam algo além de frutos de uma mente imaginativa. As nuvens ainda aparecem para lembrar-me de que sempre é tempo de chover.
Não me diga que há pássaros, não imite o som de suas asas, eu sei que não há. Eles já se foram, demorei a perceber, mas hoje já vejo claramente o céu vazio.
Eles não eram do tipo que voa em bandos. A cada dia ia um, e não voltava. Por isso custei a perceber.
Sinto falta como quem sente falta de um costume abandonado.
Olho para o céu e expiro em alívio: Não há grades que impeçam a chegada de novos pássaros.

quinta-feira, 2 de abril de 2009

A Curiosidade

O que aconteceu? Uma batida? Alguém morreu? Será que dá pra ver o corpo?

Às vezes me espanto com a curiosidade humana. Acidentes parecem ser os imãs mais potentes, no trânsito então, nem se fale! Batidas de carro sempre atraem os curiosos, ainda mais se houver vítimas.
Os olhos vão invadindo, e ficam. Logo são uma platéia. Querem ver se a vítima está morta, se quebrou algum osso, querem ver a cara retorcida de dor, ou a expressão serena de um morto. O que mais podem querem esses olhos?
Num dia , que agora eu não consigo me lembrar o nome (podia ser Segunda, Terça ou Quarta) nos deparamos com um acidente ( eu digo “nos” porque eu estava no ônibus). Tudo parado, barulho de ambulâncias. Um caminhão bateu em um carro. Mais do que ver o carro capotado, o que me espantou mesmo foram os pescoços esticados,os olhos curiosos, e os rostos na janela.
As pessoas não costumam olhar muito pela janela, se olham é sempre algo que não demora mais que alguns segundos. A não ser que na vista haja algum acidente.
Tem um ditado que diz que a curiosidade mata. Se mata eu não sei, mas que ela tem um gosto absurdo pela tragédia,isso tem.

quarta-feira, 1 de abril de 2009