sábado, 28 de fevereiro de 2009

Paciência

Aprendi a ser paciente. Paciência é só a habilidade de suportar não fazer coisa nenhuma.É sentar em um banco desconfortável, sentir as costas doerem, mas não sair dali, ainda que o banco à frente pareça melhor.

Paciência é uma forma de esperança.

quarta-feira, 25 de fevereiro de 2009

Stark

Todos tem as suas manias, uma das minhas é conversar com o Stark.

Stark é um dicionário de inglês-português que está comigo desde que veio a ordem de comprá-lo numa das listas escolares do ensino fundamental. Ele tem a resposta para todas as perguntas, sempre sabe o que dizer em apenas uma palavra. Explico : Não me lembro exatamente quando, mas passei a procurar “respostas” em palavras, indo direto à fonte, ao depósito de palavras : o dicionário. Penso em qualquer coisa e abro-o. Sabendo interpretar, tem-se a resposta. É incrível como sempre acaba fazendo sentido. Não...Ao contrário do que se possa pensar eu não estou prestes a ser mandada para um hospício. Ainda não. No tédio, no tipo de tédio que não chega a ser absoluto, é divertido. [E quem já teve o (des)prazer de conhecê-lo, sabe que às vezes assusta...]

-Tempo?
-scenery

-Vida?
-quiz

-O que me faz expor minhas sandices desse jeito?
-tell


Vou fugir antes que cheguem as ambulâncias...

quinta-feira, 19 de fevereiro de 2009

As The Years Go Passing By*

Descansar a cabeça num blues qualquer, desses lentos, e deixar-se ir...Como alguém que por não saber nadar, bóia, e quando acorda percebe que se afastou de tudo, e vê a areia, as pessoas e os guarda-sóis como se pertencessem a uma dimensão diferente...Por não saber nadar assusta-se, mas expira aliviada quando percebe que ali ainda “dá pé”.

Ás vezes é preciso deixar-se ir. Ás vezes é preciso confiar na imprevisibilidade das ondas.

Porque foi o acaso quem me trouxe esse blues...


*The Jeff Healey Band

segunda-feira, 9 de fevereiro de 2009

Cuidado com o vão entre o trem e a plataforma

O que eu vejo é uma geração inteira de coelhos, como aquele coelho do “Alice no País das Maravilhas” que corre com o relógio nas mãos e diz “È tarde! É tarde”. Eles estão sempre atrasados , nunca estão no lugar onde deveriam estar.Correm atrás do ônibus. Correm atrás do trem como se o próximo só fosse realmente passar na manhã do dia seguinte.
Correm. Sobem as escadas aos pulos, como coelhos....

sexta-feira, 6 de fevereiro de 2009

Clarice e Eu

“Mas tenho um milagre, sim. O milagre das folhas. Estou andando pela rua e do vento me cai uma folha exatamente nos cabelos. A incidência da linha de milhões de folhas transformadas em uma única, e de milhões de pessoas a incidência de reduzi-las a mim.”

O Milagre das Folhas – Clarice Lispector

Ninguém pode imaginar o quanto fiquei feliz a ao ler isso. A minha paranóia escrita de maneira tão simples!


É a teia...

quarta-feira, 4 de fevereiro de 2009

O Desenhista

Quando entrei no trem o primeiro esboço já havia sido feito com um lápis azul claro. O homem do esboço encontrava-se no lado oposto com o seu chapéu e camisa camuflados e seus fones no ouvido. Após um tempo pareceu desconfiar que estava sendo observado. O desenhista, que também usava fones de ouvido, fazia um traço e levantava os olhos . Seu olhos estavam protegidos por grandes óculos escuros, talvez fosse um truque, pensei.
Do traço azul e leve chegou-se ao traço preto e firme com alguma caneta especial, que requeria certa força para se desprender da tampa.
O resultado final foi digno de aplausos, cumprimentos. Mas o desenhista não parou. Assim que terminou de registrar aquele homem comum a porta do trem se abriu e mais pessoas entraram, e ele as devorou com os olhos escolhendo a próxima vítima. Seria um jogo divertido... Ele começaria a desenhar e eu, pelo desenho, tentaria descobrir quem era o modelo da vez.
Não foi preciso muito esforço, até porque eu já tinha o meu palpite, que se confirmou. Ele escolheu a moça dos óculos e dos cabelos cacheados presos em um coque.
Foi então que percebi que eu não era a única a observá-lo. As pessoas próximas a ele olhavam para o desenho e depois para a moça e quase sorriam.
Ela não sabia que estava sendo registrada. Por um momento pensei que soubesse, quando ela fixou os olhos no desenhista que olhava para ela e voltava a riscar a folha.De novo os óculos escuros...Como ela poderia saber se ele estava olhando para ela ou para outra pessoa?
Na folha de papel ela estava bem mais sorridente. E foi aquele sorriso, o da folha de papel, que ela deu quando recebeu o seu retrato das mãos do desenhista. Na próxima parada ela desceu do trem sorrindo e agradecendo.
Quanto ao Sr. do chapéu camuflado, ele pegou a folha,agradeceu, mas não sorriu. Dobrou o seu rosto ao meio e desceu na mesma estação que o desenhista.

terça-feira, 3 de fevereiro de 2009

Nota de falecimento

Morreu.
Morreu e levou consigo todo o seu universo.
Todas as ótimas idéias que nunca tinha contado a ninguém ficaram presas em um cérebro que não funcionava mais e que em breve serviria de alimento.
Todas ali, asfixiadas pela inatividade.
Poupou o mundo de um novo mundo.
Pois ali, naquele cérebro tinha encontrado a salvação da humanidade.
Mas morreu...

Surdez

Idéias criativas sofrem de surdez aguda.Não adianta se esgoelar...Elas não vão ouvir quando forem chamadas, não virão até nós.Passarão tão rápido que não serão nada mais que um borrão. Um borrão branco em um fundo branco.Nada.

domingo, 1 de fevereiro de 2009

Ela

Tinha aprendido a saber a velocidade do vento pelo bater das cortinas , e a se calar quando o que tinha a dizer não era mais proveitoso que o silêncio. Media as distâncias pelas músicas que ouvia durante o trajeto.Lia o mundo: Lia o humor em uma expressão facial, o risco de chuva nas nuvens, lia os gostos de alguém pelos sapatos que calçava. Estava sempre à espera de alguma coisa, o que quer que fosse...Estava sempre à espera, e no entanto, odiava esperar. Arriscava cantar quando estava só, brincava de ser alguém que canta bem. Escrevia quando precisava. Escrevia quando não precisava. Não era muito boa com números. Tinha uma imaginação fértil. Colecionava lembranças, tinha dificuldade em jogar coisas fora. Era distraída, sonhadora, idealista. Cabeça-dura.Era só uma pessoa como tantas outras.